O Brasil amanheceu, no dia 28 de maio, com a revelação de um fato novo, extremamente preocupante: a Operação Sisamnes, da Polícia Federal, desarticulou um grupo criminoso especializado em espionar e planejar o assassinato de autoridades da República, incluindo ministros dos tribunais superiores. O “Comando C4” monitorava autoridades por meio de drones e aparatos profissionais de arapongagem, com uma macabra tabela de execuções, que cobrava até R$ 250 mil pela eliminação de magistrados (pelas mãos de militares ou civis). Parece ficção, mas é realidade – e a resposta do Estado não pode ser o silêncio.
Nem anedótico, nem isolado, o episódio se insere em uma sequência de eventos que expõe o nível de vulnerabilidade enfrentado diariamente por juízas e juízes em todo o território nacional.
Infelizmente, a descoberta corrobora o que já havia sido demonstrado por um levantamento do Centro de Pesquisas Judiciais (CPJ) da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) promovido em parceria com a Federação Latino-americana de Magistrados (FLAM) e o Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe): metade dos juízes brasileiros já sofreu ameaças de morte ou à integridade física. No continente, apenas a Bolívia apresentou índices maiores.
Além disso, o estudo, intitulado “Perfil da Magistratura Latino-americana”, mostrou que só 20% dos magistrados no Brasil se sentem plenamente seguros – e 15% relatam estar totalmente inseguros.
É esse contexto que torna difícil compreender – e impossível justificar – os vetos presidenciais ao Projeto de Lei 4015/2023, aprovado pelo Congresso Nacional, que reconhecia a magistratura como atividade de risco. O texto, resultado de amplo debate e deliberação legislativa, não criava privilégios, pelo contrário: buscava adequar o arcabouço normativo ao cotidiano perigoso dos juízes. A avaliação oficial ignorou tanto a evidência empírica quanto a responsabilidade institucional de garantir condições mínimas de segurança àqueles que personificam e garantem o cumprimento da Constituição.
Vetar esses dispositivos legais, neste momento em que a violência política assume contornos explícitos, é negar o óbvio: dados, alertas e riscos já materializados.
O impacto direto da insegurança na saúde dos magistrados é outra faceta frequentemente negligenciada do problema. Também segundo a pesquisa “Perfil da Magistratura Latino-americana”, 77% dos juízes brasileiros afirmam que o nível de estresse atualmente é superior ao que enfrentavam no início da carreira – e mais da metade já precisou buscar atendimento médico devido às pressões associadas à função jurisdicional.
A magistratura não requer tratamento excepcional. O que pedimos é a aceitação da verdade: um juiz ameaçado, exposto, vulnerável, não é apenas uma vítima em potencial, mas um elo fragilizado do Poder Judiciário. Enquanto as autoridades fecham os olhos, os criminosos calibram a mira, com o propósito inequívoco de, por meio de um tiro na toga, sangrar o próprio Estado de Direito.
Frederico Mendes Júnior é presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB)
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