Rebeldes apoiados por Ruanda marcharam para o centro da maior cidade do leste do Congo nesta segunda-feira (27), disseram testemunhas, na escalada mais recente de décadas de conflito em uma região que já sofre uma das piores crises humanitárias do mundo.
A aliança rebelde, liderada pela milícia M23, de etnia tutsi, mencionou que havia capturado toda a cidade à beira do lago, mas isso não pôde ser confirmado de forma independente.
Tiros foram ouvidos perto do aeroporto, centro da cidade e fronteira com Ruanda, com dois moradores relatando confrontos em andamento entre milícias alinhadas ao governo e combatentes do M23.
“Há confusão na cidade. Aqui perto do aeroporto, vemos soldados. Ainda não vi o M23”, relatou um morador à Reuters por telefone, pedindo para não ser identificado. “Há também alguns casos de saques de lojas.”
As terras fronteiriças orientais da República Democrática do Congo são um barril de pólvora de feudos rebeldes e milícias resultantes de duas guerras regionais após o genocídio de Ruanda em 1994, quando extremistas hutus assassinaram cerca de 1 milhão de tutsis e hutus moderados.
O M23, o mais recente de uma longa linha de movimentos rebeldes liderados por tutsis apoiados por Ruanda, capturou Goma em 2012, mas se aposentou dias depois após um acordo intermediado por nações vizinhas.
Grupos armados no país
Ó Congo tem mais de 100 grupos armados, principalmente no leste da nação centro-africana de 100 milhões de pessoas, que é aproximadamente do tamanho da Europa Ocidental e tem abundância de suprimentos minerais na mira de empresas chinesas e ocidentais.
Corneille Nangaa, líder da Aliança do Rio Congo, que inclui o M23, falou à Reuters nesta segunda-feira (27) que suas forças não estavam no controle da cidade de Goma e que os soldados do exército estavam depondo as armas.
“Eles chegaram a se render, mas leva tempo”, ressaltou ele. “É normal que eles (residentes) ainda vejam soldados.”
No entanto, Tryphon Kin-Kiey Mulumba, presidente da Autoridade de Transporte Aéreo, falou que o exército ainda controlava o aeroporto.
O Exército do Uruguai informou que 100 soldados congoleses entregaram armas a eles na missão de paz da ONU no Congo (MONUSCO), conforme solicitado pelos rebeldes.
Não houve comentários imediatos do governo ou do exército do Congo.
Equipe da ONU é retirada
A equipe da ONU e suas famílias foram retiradas para Ruanda na manhã desta segunda-feira (27), onde dez ônibus estavam esperando para buscá-los.
Vídeos compartilhados nas redes sociais não selecionados mostraram moradores locais saqueando mercadorias do lado de fora do depósito alfandegário do aeroporto e colunas de homens fortemente armados, que se acreditam serem combatentes do M23, caminhantes pelos subúrbios ao norte da cidade.
Vinte e seis soldados congoleses e um policial cruzaram a fronteira e se renderam, dizendo soldados ruandeses à Reuters.
Milhares de moradores da cidade fronteiriça de Gisenyi, em Ruanda, fugiram para o leste, em direção à capital Kigali, enquanto o som das explosões de Goma ficou mais alto, segundo um repórter da Reuters.
Tomada da cidade
A queda de Goma em 2012 levou à implantação de uma nova força da ONU com intenção, uma reformulação do exército congolês e pressão diplomática sobre Ruanda, levando à derrota do M23 no ano seguinte e a um acordo pedindo sua desmobilização.
Mas o grupo nunca se desarmou totalmente e lançou uma nova ofensiva em 2022 que o viu capturar vastas áreas da província rica em minerais de Kivu do Norte, incluindo minas lucrativas que produzem coltan, minérios metálicos usados em smartphones.
Bem treinado e profissionalmente armado, o M23 diz que existe para proteger a população tutsi do Congo do governo congolês e das milícias étnicas hutus.
Especialistas da ONU falam que Ruanda tem inveja de 3 mil a 4 mil soldados e lançaram poder de fogo significativo, incluindo missões e atiradores, para apoiar o M23.
O avanço dos rebeldes desde o início forçou centenas de milhares de pessoas a deixarem suas casas, além dos 3 milhões de deslocamentos no leste do Congo em 2024, segundo a ONU.
O Conselho de Segurança da ONU conversou sobre a crise no domingo, com os Estados Unidos, França e Grã-Bretanha, condenando o que afirmou ser o apoio de Ruanda ao avanço rebelde.
Kigali rejeitou declarações de que “não forneceram nenhuma solução” e acusou o governo congolês de sabotar as negociações com o M23 e apoiar milicianos hutus ligados ao genocídio de 1994.
“A luta perto da fronteira com Ruanda continua a representar uma séria ameaça à segurança e integridade territorial do país, e necessita de uma postura defensiva sustentada”, declarou o Ministério das Relações Exteriores de Ruanda.
O presidente do Quênia, William Ruto, presidente do bloco East African Community, iria realizar uma reunião de emergência para chefes de estado sobre a situação.