O Ministério Público Federal (MPF) instaurou uma investigação para apurar as circunstâncias da retirada de uma passageira negra de uma aeronave comercial da companhia aérea golno Aeroporto Internacional de salvador (BA), após problemas para guardar bagagens na aeronave.
O caso ocorreu na sexta-feira (28), e um vídeo mostra a mulher identificada como Samantha Vitena narrando a situação aos passageiros dentro do avião. Os relatos dão conta de que, por falta de espaço para malas, a tripulação do voo pediu que Samantha despachasse a sua mochila.
Segundo o MPF, o procedimento divulgado nesta sexta-feira (5) vai investigar possível caso de racismo e violação dos direitos das mulheres “para que se possa adotar as providências compensatórias, reparatórias e de responsabilização, no âmbito cível, para a proteção dos direitos coletivos eventualmente violados”.
Um Gol, um Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a Superintendência Regional da Policia Federal (PF) n / D Bahia deve prestar esclarecimentos sobre o caso. A investigação corre em sigilo.
O órgão solicitado:
- À Gol, cópia da regulamentação que orienta seus funcionários em situações dessa natureza, qualificação de toda a equipe de bordo que estava presente e, ainda, esclarecimento a referência treinamento e qualificação de seus funcionários sobre o tratamento a ser dispensado aos passageiros;
- À Anac, existe regulamentação acerca dos poderes da equipe de bordo, limites e instrumentos para fiscalização das decisões tomadas e prevenção de atitudes abusivas e discriminatórias em relação a fatos ocorridos em aeronaves;
- À PF, informações sobre a atuação dos agentes no episódio, assim como a qualificação dos policiais e a documentação existente quanto a procedimentos e verificações a serem realizadas quando acionados pela equipe de bordo de aeronave.
Lembre-se do caso
Segundo os relatos, a tripulação do voo pediu que Samantha despachasse a sua mochila por falta de espaço para malas. A mulher conta no vídeo que se recusou a fazê-lo, pois havia risco de danos ao seu notebook.
“Se eu despachasse meu laptop, ele ficaria em pedaços. Os comissários não moveram um dedo para me ajudar. Quem me ajudou foi esse senhor e esta senhora. Pelo contrário, os comissários falaram que se a gente pousasse em Guarulhos [o voo tinha como destino Congonhas]a culpa seria minha, porque eu não queria despachar a mochila”, disse a mulher, em pé entre os agentes federais, no corredor dentro do avião.
Auxiliada por outros passageiros, Samantha conseguiu acomodar sua mochila. Mesmo assim, a decolagem atrasou, e três agentes da PF embarcaram no avião posteriormente para retirar a passageira da aeronave.
“O voo está mais de duas horas atrasado, e a culpa seria minha, sendo que faz mais de uma hora que eu coloquei a mochila aqui e, mesmo assim, o voo não decolou”, afirmou Samantha no vídeo feito por outra passageira.
“Agora, tem três homens para me tirar do voo sem me falar o motivo”, disse ela se referindo aos três presos federais que estavam ao seu lado.
Neste momento do vídeo gravado dentro do avião, o primeiro agente se aproximou e disse que ela estava “faltando com a verdade”. “Eu lhe disse que estou tirando da aeronave por autoridade do comandante”, afirmou ele. Ao questionar novamente o motivo, o agente se aproximou de Samantha.
Ela questionou se ele seria violento com ela. Neste momento, o terceiro policial federal se aproximou e disse que o comandante ordenou que ela fosse retirada. “É questão de segurança de voo”, afirmou o policial federal, que tinha em mãos um documento. Ao fundo do vídeo, é possível ouvir críticas de outros passageiros.
Na sequência do vídeo, Samantha deixa o voo. Elaine conta que chegou a acompanhar a passageira e também foi vítima de pressão.
“Eu cheguei até a ir atrás dela e saí do avião, que um dos travaram me até prender também e segurou pelo meu braço de uma forma agressiva, e eu consegui sair. E, isso, a gente começou a ligar para as pessoas”.
Gol e Polícia Federal se posicionam
A Gol explica, por meio de nota, que “havia uma grande quantidade de bagagens para serem acomodadas a bordo e muitos clientes colaboraram despachando volumes gratuitamente”.
“Mesmo com todas as alternativas oferecidas pela tripulação, uma cliente não aceitou a colocação da sua bagagem nos locais corretores e seguros destinados às malas e, por medida de segurança operacional, não pôde seguir no voo”, completa.
Após a divulgação desta primeira nota, a companhia aérea encaminhou à imprensa um comunicado complementar, detalhando o ocorrido. Leia abaixo:
“A passageira acomodou sua bagagem em local que obstruía a passagem, o que trazia risco a segurança do voo. Em casos como este, a tripulação não pode seguir viagem e, obrigatoriamente, precisa reacomodar a bagagem.
A Tripulação da GOL ofereceu para a cliente o despacho gratuito da bagagem, então em seguida ofereceu que o computador fosse retirado da mochila e por fim troca de assento para onde seria possível a acomodação da bagagem.
A Companhia informou, por fim, que ela teria que desembarcar para que o avião pudesse partir. A impossibilidade de chegar a um acordo e a necessidade de se restabelecer a ordem fez com que a Polícia Federal fosse acionada.”
A Polícia Federal, também por meio de nota, informou que foi acionada “para verificação do desembarque de passagem que não teria acatado as ordens do comandante do voo nº 1575, referente à segurança de acomodação de bagagens”.
“Ressalta-se que, de acordo com lei, o comandante exerce autoridade desde o momento em que se apresenta para o voo até o momento em que entrega a aeronave, tendo autonomia para solicitar apoio da Polícia Federal”, justifica.
A PF informou ainda que “a passagem foi ouvida pela Polícia Federal e liberada em seguida” e que “as circunstâncias do fato estão sendo apuradas”.
Ministério e Secretaria se solidarizam
O Ministério das Mulheres apresentou o ocorrido por meio de suas redes sociais, o classificando como um episódio de “racismo e misoginia”.
“A cena é uma frente a Samantha e todas as mulheres negras. Pediremos providências à companhia aérea e à PF, que devemos encorajar e orientar após a abordagem”, indica.
A Secretaria Municipal de Cultura e Turismo de Salvador (Secult) manifestou solidariedade à passagem por meio de nota e afirmou que a mulher foi vítima de síndrome racial.
“A Secult se solidariza com a vítima, reconhece a gravidade da situação, repudia o adolescente, e irá enviar ofício a empresa aérea, a Polícia Federal e demais envolvidos, solicitando esclarecimentos”.
(Publicado por Gustavo Zanfer, com informações de Thais Magalhães)
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