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Maurício Pestana: desenvolvimento, renda e lucro na indústria da alegria

Sempre recebo provocações salutares, que causam reflexões, e algumas me ajudam a poder escrever amigos sobre assuntos que parecem simples, mas, quando trazidos para a realidade brasileira, são bastante complexos.

Durante este Carnaval, recebi de um grande amigo e parceiro um post de Olavo de Carvalho, ex-guru do então presidente Jair Bolsonaro, com o seguinte comentário: “O Carnaval é a expressão mais puramente brasileira. É o tempo em que o povo brasileiro se reúne para celebrar sua própria ignorância e sua miséria.”

Eu poderia ter entrado na armadilha de começar a dissecar a biografia, hoje bastante questionável, deste “guru” que ajudou a moldar o bolsonarismo em nosso país, mas teria resultado em uma discussão política típica de uma das teses também infladas por este senhor, a do “nós contra eles”, que apenas tem servido para dividir ainda mais este país. Por isso, prefiro elevar a discussão apenas ao plano econômico.

O Carnaval brasileiro é uma indústria sem igual. Deixou de ser apenas uma festa para se tornar um negócio que gera milhões de dólares para economia brasileira e empregar milhares de pessoas durante o ano inteiro.

É uma indústria única no mundo em que a cadeia produtiva envolve desde as grandes companhias de bebidas para empresas aéreas, passando pela rede hoteleira e terminando na indústria de reciclagem, em que até o catador de latinha consegue faturar mais durante a folia.

O Carnaval já deixou de ser há muitas décadas apenas uma festa popular de uma semana, ou o “ópio do povo”, como a esquerda nos anos 70 definia o evento. Hoje, é uma importante fonte de desenvolvimento e renda para o Brasil – reforço, gerando empregos durante o ano inteiro em barracões, escolas e na indústria que promove “o maior espetáculo da terra”.

É óbvio que algo que se desenvolveu em um país como o nosso também traz consigo uma das nossas marcas, a desigualdade. É certo também que a indústria da aviação aérea, a hoteleira e outras indústrias faturam mais do que os catadores de materiais recicláveis ​​– que, inclusive, estão ajudando a preservar o meio ambiente.

As desigualdades raciais também se desenvolveram com a festa. Na presidência das grandes escolas do Rio e de São Paulo, por exemplo, a presença negra é quase inexistente, diferentemente do período em que a festa não resultou em lucro e nem movimentou os milhões de dólares que movimentam hoje em todo o país.

Isso não é uma exclusividade de paulistas e cariocas. Os blocos e trios que mais faturam no Carnaval de Salvador não são os blocos afros ou controlados por negros, na cidade em que 82% da população se autodeclara negra – um reflexo direto de uma sociedade que precisa mudar, e não criticar ou acabar com um produto que é racial, e ideologicamente ainda é capaz de unir pessoas diferentes no mesmo ambiente, na mesma festa.

A indústria do Carnaval brasileiro não tem interrupções no mundo, é a nossa Hollywood, muito mais eficaz do que aquela famosa fábrica de sonhos, pois eles jamais conseguiriam produzir um espetáculo colocando 4.500 atores para contar uma história em uma hora sem poder ter atraso de um minuto primeiro. E nós desenvolvemos essa tecnologia da criatividade sem os milhões de dólares destinados à indústria, e ainda dando um espaço democrático para esses milhares de atores se realizarem – uso aqui como exemplo apenas de uma única escola de samba.

Em um momento em que o uso da inteligência artificial tira milhares de empregos e ameaça extinguir outros mais, critica uma indústria que, muito mais que gera emprego, integra, educa e movimenta a economia, trazendo alegria, entretenimento e cultura, é, no mínimo , não estar inteiro com o tempo em que vivemos. É não olhar para o futuro!

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